10 Anos de Calciopoli: O outro lado da moeda


Na última semana de abril um dos casos mais polêmicos de toda a centenária história do futebol mundial fez aniversário. Há exatos 10 anos, já no final da temporada europeia e a algumas semanas do início da Copa do Mundo de 2006 na Alemanha, o mundo futebolístico parou com um chamado escândalo de corrupção que abalaria toda a Europa.

Tudo se iniciou quando o jornal Gazzeta Dello Sport publicou como manchete escutas telefônicas ilegais do diretor-geral da Juventus, Luciano Moggi, reclamando da arbitragem com um árbitro de uma partida em que o clube de Turim saíra derrotado. Essa manchete rendeu semanas e semanas de noticiários, e outras diversas conversas foram divulgadas, causando uma avalanche no cenário mundial. Como já sabemos, esse escândalo ficou conhecido como Calciopoli, causando o rebaixamento da atual bicampeã da Serie A, Juventus, e punições severas para Milan, Fiorentina e Lazio.


A história “padrão” todos conhecemos, afinal, já diz o ditado: “Quem ganha a guerra, conta a história”. Porém, nesse aniversário de 10 anos, tal escândalo impactou com uma ruptura na força do Calcio e trouxe crises para o futebol da Bota, fazendo assim os craques pouco a pouco migrarem do sul da Europa para outras ligas alternativas como a inglesa, alemã e espanhola.

Para quem me conhece, sabe que não escondo minha paixão pela Velha Senhora de Turim, aliás, por muitas vezes acredito que expresso até demais toda essa paixão, mas trago a vocês nada mais do que a visão do outro lado do muro, as acusações todos sabemos quais são, talvez não seja ruim vermos as defesas e as contestações do lado considerado escuro da história.  Reforçando que TODAS as informações citadas nessa matéria são verdadeiras e sem alteração alguma, podendo ser encontradas nas antigas matérias dos jornais digitais (principalmente do Gazzeta), e também em vários blogs e noticiários da época. Para complementar, a maioria do que é dito aqui não é apresentado como uma verdade exata, mas sim apresentada para que possamos analisar e tirar nossas próprias conclusões sobre o caso.

A POLÊMICA E O JULGAMENTO 

Após a polêmica bombar por semanas, a situação do futebol na Itália estava caótica: dentro das escutas, Juventus, Fiorentina, Milan e Lazio eram os envolvidos da Serie A, e clubes menores como Reggina e Arezzo também estavam envolvidos em toda a confusão. Vale ressaltar que as escutas vazadas pelo Gazzeta eram ilegais e feitas pela TIM.

19 jogos foram investigados por conta do suposto esquema de manipulação: 7 eram da Juventus, 5 da Fiorentina, 5 da Lazio e 4 do Milan.

Já no primeiro julgamento - realizados às pressas, pois a FIFA pressionou a Itália para resolver logo a situação, ou então a seleção italiana ficaria fora da Copa do Mundo, na qual seria campeã -, a justiça decretou o rebaixamento da Juventus para a Serie C e 6 pontos negativos logo no começo da temporada.

Fiorentina e Lazio foram rebaixadas para a Serie B com 15 pontos negativos iniciais e o Milan, estranhamente, foi rebaixado para a Serie B, mas com apenas 3 pontos negativos.

Obviamente, os 4 clubes recorreram, e no novo julgamento foi definido que a Juventus, Fiorentina e Lazio seriam rebaixadas para a Serie B. Juventus começaria o campeonato com 30 pontos negativos, Fiorentina 12 e Lazio 7. O Milan? Bom, o Milan não seria mais rebaixado, teria 44 pontos negativos na próxima temporada e estaria proibido de participar de quaisquer competições europeias.

No julgamento final, foi determinado que a Juventus perderia os títulos de 2004/05 e 2005/06, seria rebaixada, e começaria a Serie B com 9 pontos negativos.

Fiorentina perderia 15 pontos, o Milan 8, e a Lazio 7, e os 3 permaneceriam na Serie A, com apenas a Juventus sofrendo as punições severas. Dois jogos de acusação a menos, e não tiveram toda essa severidade.
Torcedor da Juventus protesta contra a Internazionale no caso Calciopoli

INTERNAZIONALE E AS CONTROVÉRSIAS DE TODO CASO 

Em meio a toda essa bola de neve, dos 6 mais populares clubes da Itália no momento (Napoli estava em divisões inferiores por conta de sua falência), apenas 2 clubes não estavam no meio: a Roma e a Internazionale. Mas, todos se perguntam o porquê da Internazionale não ter sido sequer investigada no caso. Muitos diriam que é conspiração, ou as controvérsias poderiam ser chamadas de “coincidências”.

Como parar os rivais Milan e Juventus diante de toda essa hegemonia? Após 10 anos sem títulos, a situação desanimou mais ainda ao ver Roma e Lazio erguerem o caneco no início do novo século, enquanto a Inter continuava no ostracismo. Mais 5 anos passaram, completando 15 de jejum, até que Carlo Buora, vice-presidente da Inter e um dos acionistas do Gazzeta Dello Sport, publicou sobre as escutas vazadas para dar início a toda confusão. Confusão? Nada. É apenas uma coincidência que o vice-presidente da Inter fosse um dos donos do jornal e publicasse sobre as escutas.

O Milan, por sua vez, estava envolvido em toda a polêmica, porém, “estranhamente”, como citado acima, tomou punições menos severas, vistas por muitos com melhores olhos. Talvez seja pelo fato do presidente da Federação Italiana ser Adriano Galliani, vice-presidente e diretor do Milan. Mas é óbvio que isso não influenciou na bondade dos julgamentos com o rossonero: é apenas mais uma coincidência.

Como também dito, Juventus, Fiorentina, Lazio e Milan perderam suas vagas em quaisquer que fossem as competições europeias que disputassem. O Milan, já nos 45 do segundo tempo, conseguiu não ser punido com essa restrição e se classificou para a Liga dos Campeões, classificação essa que o levaria a ser campeão pela sétima e última vez.
Sem punição, o Milan ergueu o caneco mais importante da Europa.

Outro ponto muito interessante foi que, Adriano Galliani, ao ser forçado a deixar a presidência da Federação Italiana, deu lugar a Guido Rossi, maior acionista da Internazionale, ex-diretor e, é claro, torcedor nerazzurro. Grande amigo de infância de Moratti, o “presidente que investe e não tem retorno algum”. Mais uma das coincidências que envolvem a polêmica.

Após o julgamento punir Juventus e aliviar Fiorentina, Lazio e Milan, Guido Rossi deixou a presidência da Federação Italiana e assumiu a presidência da TIM (a mesma que publicou escutas ilegais), em que Buora era um dos diretores.

Tudo coincidência que a Tim, Gazzetta Dello Sport e FIGC (Federação Italiana) estivessem ligadas diretamente à Internazionale Milano.
Moggi em audiência nos tribunais italianos


DESFECHO DO JULGAMENTO E CONCLUSÃO 

A Juventus e sua diretoria não aceitam a cassação dos seus títulos de 2004/05 e 2005/06, e até hoje conta 2 títulos a mais em seu currículo. A Inconformidade maior é a cassação do título de 2005/06, que sequer houve escuta sobre esse campeonato, que acabou sendo entregue à Inter. O título da Juventus foi retirado num escândalo de manipulação de resultados em que sequer houveram acusações relativas à temporada.

Para quem achava que essa novela já teve um final, se enganou: em 2010 a polêmica voltou a ser discutida quando se descobriu que Luciano Moggi utilizou chips de telefone suíços para fazer suas supostas ligações telefônicas. Então não havia como a TIM de forma ilegal conseguir essas escutas, não haveria como invadir toda essa privacidade. Dessa forma, é completamente entendível, para qualquer pessoa que analise a situação por 2 minutos, que essas escutas não eram legítimas.

O problema ficou mais alarmante quando um dos responsáveis no judiciário para guardar essas provas, Attilio Auricchio, supostamente “perdeu” as gravações. Mais uma vez, vemos coincidências. Apenas coincidências que não inocentam em nada a corrupta Juventus.

Andrea Agnelli, então presidente da Juventus, em 2010 reabriu o caso na justiça Italiana pelo simples fato de que nunca houveram provas concretas que incriminassem a Juventus nesse escândalo. Não houve uma escuta que provasse alguma manipulação.

Agnelli, desde 2010, vem ganhando todas as audiências sobre o caso Calciopoli. o presidente e acionista do grupo FIAT pede a anulação da cassação dos 2 títulos daquele ano e uma indenização de 1,7 bilhões de reais como reparo para a perca de patrocínio, marca, bilheteria, cotas e jogadores como Cannavaro, Zambrota, Viera, Ibrahimovic, Thuram, Emerson e etc. Caso Agnelli ganhe definitivamente isso na justiça, é certo que a Federação Italiana vá à falência pela cifra exorbitante a ser paga, haja visto que nenhuma federação mundial conseguiria pagar por essa indenização.

Já se perguntaram o tamanho da bomba que estourou nas mãos da Federação Italiana? A pressão pra resolver um caso rapidamente - sem condenação por provas - pela falta de tempo, sob ameaça de não disputar a Copa de 2006, fez a FIGC tomar medidas errôneas, rebaixando a Juventus.

Mas é de se entender o problema nas mãos da Federação: como rebaixar Juventus, Milan, Lazio e Fiorentina? A força do campeonato iria despencar de forma assustadora, levando o Calcio em crise. Talvez, punindo a equipe mais propícia a se reerguer rapidamente, seria um alivio em toda essa bagunça.

A Internazionale deveria ser investigada por reestruturar um tribunal para justificar um suposto rebaixamento, violar direitos constitucionais, espionar com escutas ilegais através de movimentação de seus cartolas na TIM e forjar essas ligações, afinal nem sequer havia como grampear sendo que os chips eram suíços. Todas essas acusações de defesa da Juventus continuam como uma papelada nos ministérios públicos de Roma e Nápoles, e talvez um dia sejam julgados como deveriam ser julgados.

A polêmica está aí: toda essa bola de neve destruiu o que para muitos era o melhor campeonato do mundo, levando todos os craques e os investimentos, trazendo desgosto para o próprio torcedor Italiano.

A Juventus foi rebaixada, perdeu mais de um bilhão em marca, perdeu seus vários craques, ganhou a Serie B, se reestruturou, construiu um estádio moderno e rentável, reformulou sua diretoria, em 5 anos voltou a reinar dentro da Itália, está a 5 anos consecutivos levantando o caneco e não parece que esse domínio para por aí... então, quando se perguntarem o porquê que o Campeonato Italiano está supostamente um lixo, pare para analisar que talvez seja o que chamamos de Karma, se é que isso existe no futebol.
Do título da Serie B a atual hegemonia. A Juventus se reergueu.

Afinal, feio não é para o clube que caiu sem provas algumas, feio são os clubes que tiveram meia década para se prepararem contra o time que estava por baixo e não conseguiram, deixando hoje o mesmo clube disparar todo ano mais de 10 pontos de diferença de seus rivais.

Todos sabemos que a fama do futebol italiano não vinha de 2006: lá em 1979 o mundo havia sido abalado pelo Totonero, outro escândalo de corrupção que causou o rebaixamento de Milan e Lazio, porém, esse foi julgado e provado, ao contrário do Calciopoli, que nem evidências concretas tem.

Em nenhum momento nesse extenso texto houve afirmações de que a Juventus não estava nada envolvida nessa história, de que é inocente, de que não sabia de nada (sequer que esse suposto sistema de manipulação realmente existiu), mas sim uma crítica à má administração de toda essa polêmica, a forma errônea cujo foi julgada, e o desfecho de toda essa bola de neve.

A crítica é de como fora condenada de forma rígida à Juventus, e os demais clubes não sofreram tudo com isso, e mais, os outros 3 envolvidos também não tiveram sequer algo comprovado para que sofressem punições mais leves. O Calciopoli é uma das polêmicas mais duvidosas da história do futebol italiano, a mentira do século: cheio de fatos questionáveis e de aparente parcialidade, o que demonstra uma mancha suja na história da justiça italiana.
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