Amado sentimento heroico


Os super-heróis são venerados pelas crianças. Os redentores, destruidores do crime estão em todos os lugares. Todo o tempo. Na televisão, nas estampas de roupa e, principalmente, nos quadrinhos, o mundo dos sonhadores.

A admiração talvez seja pela bondade e luta eterna contra o mal, a força e os raios ultrapoderosos ou a possibilidade de salvar toda uma galáxia em uma só batalha. É demais para uma criança imaginar ter um dia tanto poder nas mãos. É também sonho para outras, que com um sopro apagam as velas sobre o bolo de aniversário e desejam um dia voar.

Aquelas crianças que leram e viram os heróis solucionando os mais complexos casos da maneira mais simples, crescem. A maioria delas ainda acredita neles. Não mais na visão extremamente aguçada, possibilidade de voar ou força física sobrenatural, mas sim na capacidade de alguém fazer tudo ser diferente. Acreditam nas pessoas adultas como elas. Os libertadores do mal marcam presença nos mais diversos aspectos e discussões da sociedade, onde o sentimento da salvação pelo meio individual é onipresente.

Nosso atual redentor é sereno, estudioso, justo e, ao mesmo tempo, muito intenso. Seus cabelos com mescla preta e grisalha exibem sua experiência. A fala pausada passa segurança para quem ouve e os sorrisos interpelam os presentes, que se espremem para conseguir uma declaração do homem de mais de um metro e oitenta sentado atrás de uma bancada branca. Adenor Bachi é gaúcho e quando não está usando sua capa para salvar a honra brasileira é um homem que preza sua família, sempre citando a importância dos parentes em suas vitórias. Quando entra na beirada dos campos de batalha contra os vilões, seu nome de super-herói é gritado pelos presentes na arena. Tite. Adenor Bachi agora é Tite. Com um T bem grande estampado no peito, como pede a identificação dos grandes super-heróis. O vingador do Brasil, da nossa seleção.

Adenor atualmente é o reflexo do que o brasileiro sente. Depois de três edições sem a seleção brasileira em uma final de Copa e um vexame histórico no último encontro das potências mundiais do futebol aqui no Brasil, o tupiniquim ficou cabisbaixo. Nos anos seguintes se sentiu amargurado com eliminações que não foram bem digeridas. Corroía. Aquela não era a seleção que um dia encheu os olhos e salvou todos da tristeza.

Tite vestiu o uniforme no ano passado, com poucos adornos e sem capa. Apenas um paletó sobre a camisa branca social. Em oito jogos no comando da seleção canarinho não perdeu nenhuma partida e goleou grandes seleções. Faltam quatro rodadas para o fim das Eliminatórias Sul-Americanas e o Brasil se mantém como o único país a participar de todas as Copas do Mundo.

A confiança dos brasileiros amantes de futebol voltou. Nas mesas de bar se ouve conversas sobre o show dado na noite anterior e perguntas de quem o Brasil enfrentará na final da próxima Copa, intercaladas de sonoras risadas.

Nas últimas três edições de Copa do Mundo o Brasil chegou confiante. Um dos favoritos para levantar o caneco. Como sempre. Em 2006 tinha o “quadrado mágico”. O meio de campo era composto por Kaká, que um ano depois viria a ser eleito melhor jogador do mundo e Ronaldinho Gaúcho, ainda no auge da forma física e técnica. Mais à frente Adriano, o Imperador de Milão e Ronaldo, o fenômeno, campeão quatro anos antes. A eliminação que era improvável veio dos pés do vilão Thierry Henry, naquela quartas de final em Frankfurt.

Na edição seguinte a empolgação era comedida, mas existia. Afinal, mesmo sendo um time mais pragmático, havia ganhado títulos importantes, como a Copa América de 2007 e a Copa das Confederações de 2009, além de raramente perder amistosos, mesmo quando enfrentava equipes fortes. Derrota dolorosa contra os holandeses por 2 a 1 e mais uma eliminação difícil de digerir.
Em 2014 era o ano da glória. Jogávamos em casa e havíamos vencido a Espanha na final da Copa das Confederações um ano antes de forma moralizadora. O resultado daquela semifinal no Mineirão todos já sabem.

A seleção brasileira de futebol é como aqueles super-heróis clássicos, extremamente valorizados, estudados e com muita história para protagonizar. Sempre será uma das favoritas nas batalhas, seja onde for.


O líder desse projeto atual é o mais capacitado para estar no cargo. Boas filosofias, títulos na bagagem e carisma. Tem méritos. Inúmeros. Sabe tática como muitos bons treinadores e gere um elenco de craques como poucos conseguem. Chega ser emocionante ver o torcedor brasileiro confiante novamente. Grita aos quatro cantos o quanto está feliz e de longe já ameaça os alemães. Brada suas próximas glórias como se já soubesse de tudo. É tocante.

Adenor pode ser nosso herói, daqueles que sempre vimos nas páginas de HQ. Que nos libertou da amargura, de esperas e angústias em meio a vergonhas. 

Daqui a pouco mais de um ano Tite também pode se tornar o vilão. Pode ter nos enganado e nos levado a mais um calvário. 

Talvez não por culpa dele. Talvez seja pela nossa, que acreditamos em super-heróis.

Compartilhar: Plus